Entenda a cirurgia de reconstrução do LCA de Paulinho, do Corinthians

Nesta semana, o torcedor corintiano ficou extremamente triste com a noticia da lesão do ligamento cruzado anterior do jogador Paulinho, que saiu de campo aos 26 minutos do primeiro tempo na vitória por 1 a 0 contra o Fortaleza pelo Brasileirão. Em uma disputa normal na intermediária defensiva, o camisa 15 caiu para trás e o joelho fincou no gramado, sofrendo entorse com consequente ruptura do ligamento cruzado anterior (LCA).

Frente à noticia de um jogador profissional de futebol com uma lesão dessas e de um afastamento do esporte, diversas duvidas surgem: por que precisa operar? Quanto tempo para voltar a jogar? Podem ficar sequelas? Antes mais nada, é preciso entender o que é o ligamento cruzado anterior (LCA).

Um pouquinho de anatomia

O joelho é essencialmente uma articulação que é mantida unida pelos ligamentos colateral medial (LCM), colateral lateral (LCL), cruzado anterior (LCA) e cruzado posterior (LCP). O LCA corre diagonalmente no meio do joelho, evitando que a tíbia deslize para a frente do fêmur, além de proporcionar estabilidade rotacional ao joelho.

A superfície de sustentação de peso do joelho é coberta por uma camada de cartilagem articular. Em ambos os lados da articulação, entre as superfícies cartilaginosas do fêmur e da tíbia, estão o menisco medial e o menisco lateral. Os meniscos atuam como amortecedores e trabalham com a cartilagem para reduzir as tensões entre a tíbia e o fêmur.

Sobre a lesão

O ligamento cruzado anterior (LCA), quando lesado parcial ou totalmente, possui potencial de cicatrização pobre. Suas fibras colágenas, uma vez alongadas, tornam-se insuficientes e o ligamento, muitas vezes torna-se horizontalizado (caído) dentro da articulação. Tentativas de se suturar boca-a-boca, restituindo tamanho e elasticidade, no início do século passado tiveram resultados insatisfatórios. Isso, junto aos maus resultados de pacientes jovens, ligados ao esporte, tratados sem cirurgia, levou pesquisadores a pensarem na substituição do ligamento insuficiente por um enxerto, ou neo-ligamento, que pudesse ser posto em locais anatômicos, ou muito próximos dos mesmos e que, após a cicatrização, tivesse função semelhante ao LCA em níveis pré-lesionais, fazendo com que o indivíduo voltasse a ter um joelho estável.

Por que se indica a reconstrução do ligamento cruzado anterior?

Conforme descrito no tópico anterior, estudos demonstram que a taxa de maus resultados de “joelhos LCA-deficientes” tratados de maneira não-cirúrgica é muito alta e inaceitável para pessoas que praticam esportes, principalmente os que envolvem giro, drible e desaceleração. Um candidato “ideal” à realização da cirurgia é um indivíduo jovem, ativo e ligado à pratica esportiva. Obviamente, assim como em outras áreas da medicina, o bom senso deve prevalecer. Paciente em faixa etária mais elevada, ligados ao esporte que não desejam abandonar ou substituir suas atividades também são ótimos candidatos à cirurgia, assim como pessoas que sentem o falseio para suas atividades da vida diária.

Seleção do enxerto

Uma vez indicada a cirurgia de reconstrução do ligamento cruzado anterior, o cirurgião de joelho vai optar pela melhor escolha do enxerto a ser usada. Sua escolha envolve fatores como suas propriedades biomecânicas, resposta à cicatrização, morbidade da área doadora, resistência de sua fixação inicial e incorporação biológica. Fatores como o grau de deslocamento instabilidade, lesões ligamentares associadas e prática esportiva com saltos ou agachamento devem ser levados em conta; porém, é a experiência do cirurgião o fator decisivo e de maior segurança ao paciente.

Na década de 80, utilizou-se material sintético tipo Dacron, Teflon e polipropileno. Os resultados a longo prazo mostraram alta taxa de complicações devido a falha de material e reações inflamatórias. Atualmente, os enxertos mais usados e mais bem-sucedidos são os biológicos. Os enxertos de doadores cadáver são muito utilizados nos Estados Unidos da América.

No Brasil e em outros países do mundo, as fontes mais comuns para a obtenção dos enxertos são os retirados do próprio paciente, sendo os mais utilizados os tendões semitendíneo e grácil dobrados e o tendão patelar com fragmentos ósseos.

Enxerto do tendão patelar

Retirada do enxerto do terço central do tendão patelar:

O enxerto osso-tendão patelar-osso retirado com aproximadamente 8 a 11 milímetros de largura e fragmentos ósseos da tíbia e patela tem sido muito popular por suas propriedades biomecânicas muito semelhantes ao ligamento cruzado anterior e, por este motivo, muitos autores o indicam como substituto ao ligamento pré-existente em atletas de alto rendimento, que necessitam de total estabilidade para a prática esportiva. As desvantagens incluem a morbidade do sítio doador e problemas específicos relacionados ao tendão patelar, como fraqueza do músculo quadríceps, dor patelar, tendinite e fratura da patela.

O uso dos chamados “tendões flexores”, ou “isquiotibiais” tem se tornando cada vez mais popular entre cirurgiões de joelho. Nesta técnica, colhemos o tendões grácil e semitendíneo, que são facilmente palpados na região interna e ligeiramente atrás do joelho. Quando preparados e dobrados, produzem uma estrutura cilíndrica com maior volume de tecido, maior resistência ao ligamento cruzado anterior pré-existente, porém com maior elasticidade, quanto comparado ao enxerto descrito anteriormente, podendo causar algum grau de frouxidão pós-operatória, que clinicamente não é significante, ou seja, raramente leva a queixa de falseio pelo paciente.

Vias de acesso e confecção dos túneis

Para que o enxerto seja colocado de maneira correta, são necessários túneis ósseos, realizados tanto na tíbia quanto no fêmur. Isso pode ser feito tanto através de uma incisão anterior do joelho, que chamamos de “via aberta”, quanto através da artrocopia, que chamamos de “via artroscópica”. Esta última tem a vantagem sobre a primeira por agredir menos a articulação e, portanto, levar a um pós-operatório menos doloroso e a uma reabilitação mais rápida. A artroscopia é realizada infundindo-se soro fisiológico e inflando-se a cápsula que envolve o joelho, permitindo-se visualizar, em um vídeo, estruturas intra-articulares e manipulá-las através de pinças desenhadas especialmente para isso. O acesso destas pinças para dentro da articulação são os “furinhos” por fora do joelho, que denominamos portais. Outras lesões como rupturas de meniscos, fraturas e lesão cartilaginosas podem e são tratadas no durante a artroscopia.

Fixação do enxerto

Para que haja cicatrização do enxerto nos túneis confeccionados, o enxerto necessita ser fixado de uma maneira mais rígida possível. Estudos demonstram que o afrouxamento e perda do enxerto têm, entre outras causas, uma fixação insuficiente. Para que haja fixação forte o suficiente, utilizamos uma ampla variedade de dispositivos, popularmente conhecidos como “pinos”, dentre os quais os parafusos metálicos e absorvíveis, amplamente utilizados. A técnica optada para fixação, assim como a escolha do enxerto, dependerá principalmente da experiência do cirurgião.

O que ocorre com o enxerto no período pós-operatório?

Uma vez fixado de maneira estável, o enxerto cicatrizará dentro dos túneis ósseos criados, passando por um período de revascularização e repopulação celular, que chamamos de “ligamentização”. Durante este período, o paciente estará em processo de reabilitação, no intuito de se ganhar massa muscular, arco de movimento semelhante a níveis pré-lesionais e, posteriormente, equilíbrio e explosão muscular. Durante todo este processo, o enxerto estará em processo de cicatrização e a articulação deverá ser protegida de esforços repetitivos e novos torques rotacionais, sob supervisão de um fisioterapeuta experiente.

Retorno ao esporte

O retorno ao esporte é dado e por equipe multidisciplinar envolvendo o médico fisioterapeuta e o preparador físico. Inicialmente, testes de força, potência e resistência muscular são aplicados, além de testes funcionais, para se avaliar a qualidade do movimento daquele atleta.

Estes testes, detectados em exames como o dinamômetro isocinético e da avaliação biomecânica Functional Movement Screen (FMS), são então trabalhados até que o atleta se sinta apto a retornar ao esporte. O retorno é dado de maneira gradual, sempre assistido pela equipe até que haja capacidade plena de volta ao esporte.

Atletas mais jovens e com melhor memória muscular costumam ter uma facilitação durante todo o período da reabilitação, e por este motivo acabam conseguindo um retorno um pouco mais rápido em relação ao atleta amador.

Fonte: Eu Atleta – globo.com

Em caso de dúvidas, entre em contato com um dos especialistas do Espaço Ortopedia ou agende sua consulta pelo e-mail clinica@espacoortopedia.com.br