Por que a recuperação de Andy Murray foi melhor que a do Guga?

A resolução da dor do quadril do tenista Andy Murray é motivo de esperança para pacientes no mundo todo e sua recuperação desafia os limites da medicina atual. Acabei de ver sua participação no ATP de Indian Wells, nos Estados Unidos (outubro 2021), e fiquei surpresa em vê-lo jogando tão bem! A doença de Andy Murray se chama impacto femuroacetabular e é uma síndrome em que existe um impacto na articulação do quadril, que é a parte da bacia onde o fêmur se encaixa. Esta doença é a mesma que acometeu nosso maior tenista brasileiro, Gustavo “Guga” Kuerten, no passado e hoje vemos que pode evoluir para um desgaste articular quando a superfície entra em processo de degeneração avançado sendo indicado, dependendo do caso, sua substituição por prótese.

Mas o que vim mostrar a vocês nesse artigo é como a ortopedia é surpreendente. Sua evolução mostra que mesmo casos semelhantes de lesões, quando separados pelo tempo, podem evoluir de formas diferentes. No caso do nosso Guga, o desfecho foi a aposentadoria em 2008. Mas hoje, 13 anos depois, verificamos que já é possível retornar ao alto rendimento mesmo após uma prótese de quadril.

O fato de uma lesão em um atleta de alto nível ser recuperada tão rapidamente pode até não causar tanta surpresa. Porém, o caso de Murray era grave dado o desgaste acentuado da articulação, decorrente do esporte de alto rendimento além do impacto previamente diagnosticado.

A prótese escolhida foi chamada resurface ou resurfacing (prótese de recapeamento do quadril), colocada no tenista em 2019, na Inglaterra, por uma médica chamada Sarah Muirhead-Allwood (e ele já havia feito uma promeira cirurgia em 2018). Andy Murray teve seu quadril substituído por uma articulação artificial pela mesma ortopedista que já operou a Rainha Elizabeth e o falecido Príncipe Philip. E Murray voltou a competir com os melhores do mundo já em 2019, e já está em suas melhores condições físicas, como pude evidenciar nesta competição de 2021, em Indian Wells.

A técnica cirúrgica de substituição de quadril foi criada para tratar casos avançados de artrose. Na maioria das situações, as pessoas sonham apenas em voltar a simplesmente caminhar. Com seu exemplo, Andy Murray inspira os “biônicos”, termo carinhoso que muitos pacientes com prótese de quadril se autodenominam, a superarem suas dificuldades iniciais e renascerem para uma nova vida após a cirurgia: o esporte!

O simples fato de Murray estar nos EUA e ganhar duas partidas demonstra a determinação mental e física do atleta aliada à precisão da sua ortopedista e sua equipe de reabilitação, feito histórico que representa a perfeita união da engenharia, tecnologia, e, acima de tudo, multidisciplinaridade – pois além de tudo, são necessários uma alimentação balanceada e preparador físico e técnicos cientes das questões protéticas.

Esse tipo de cirurgia é tão importante e revolucionário que foi eleito o procedimento cirúrgico do século, pois é o tratamento médico que tem a maior capacidade de ganho de qualidade de vida – e temos exemplos também na substituição de joelho, tornozelo, ombro, cotovelo e até dedão do pé. Sim, temos próteses para substituir todas essas articulações mantendo sua mobilidade!

Muitos ortopedistas ficam apreensivos e até criticam a participação em esportes de alto nível e alto impacto para pacientes com articulações artificiais, já que obviamente a articulação artificial não é igual a uma natural. Assim como o quadril biológico sofreu um processo degenerativo, o quadril artificial também está sujeito a maiores desgastes com esse tipo de atividade e isso faz com que a vida útil da prótese diminua.

É possível que a prótese de quadril de Murray dure menos do que implantes realizados em atletas e esportistas com menores demandas ou até mesmo para pessoas normais em termos de volume de atividade física. Guga por exemplo, parou o alto rendimento e muito provavelmente não precisará de revisão tão cedo.

Talvez carreiras como a do nosso Guga Kuerten pudessem ter sido prolongadas, talvez de um leitor aqui do Eu Atleta possa ser ajudado. Sem dúvida, os procedimentos de artroplastia (substituição de articulações) têm evoluído muito nos últimos anos, mas a indicação precisa só pode ser feita pelo ortopedista especialista, pois cada caso é individual. O importante é saber os potenciais riscos e benefícios deste procedimento e escolher um bom médico para discutir suas indicações.

Bons treinos, valentes! E viva a evolução!

Em caso de dúvidas, entre em contato com um dos especialistas do Espaço Ortopedia ou agende sua consulta pelo e-mail clinica@espacoortopedia.com.br